segunda-feira, outubro 27, 2014

SE MEU PAI ESTIVESSE AQUI COMIGO HOJE...

Pai, vejo o teu vulto imenso transpor neblinas,
o cenho franzido, o olhar arguto,
o pensamento quase saltando para fora de si mesmo,
sem palavras...

Como se no teu andar e na direção de tuas atenções
e no cantar em voz tonitruante,
subindo as escadas do prédio que te levavam à casa pastoral
as convicções mais puras,
o Evangelho em matéria-prima
caminhassem contigo.

Vejo tuas mãos volumosas, fortes,
que me disciplinaram na infância,
me protegeram na adolescência
e encaminharam muitos em direção a Deus
e vejo o cenário de tua presença
compondo um objetivo só: a cruz de Cristo.

E vejo a saudação amiga,
o gesto provinciano de acolhimento
e o riso solto; a gargalhada às escâncaras
- tua marca registrada -
a indicar tua presença.

E sinto tua figura assomando o púlpito
e recepcionando o povo para o culto
e fazendo um trocadilho qualquer
que quase sempre provocava riso
(quase sempre)
porque às vezes a piadinha era sem graça,
mas a gente ria assim mesmo do teu humor matuto.

E tuas convicções eram profundas
e tuas pregações intensas,
em voz forte e avassaladora.
Podia-se não concordar com tuas ideias,
mas, sempre se aplaudia
- mesmo que no íntimo -
tua paixão pelos temas que te incendiavam o coração
(sem contar que era impossível dormir durante a tua prédica).

Vejo, ainda hoje, como ardia meu coração adolescente
com tuas pregações missionárias
que me levavam a dizer “eis-me aqui”
e encaminhar-me para o Seminário.
E, como eu enxergava, com os olhos da fé,
os campos brancos para a ceifa
mesmo em meio ao verde intenso
da Natureza friburguense.

Vagueiam luzes em meu pensamento,
quando recordo tua figura marcante que
me faz falta nestes dias
(em especial neste Dia dos Pais)...
As luzes que acendestes com o teu caráter
e o teu amor a Deus,
e o teu compromisso com o Evangelho;
que me faz sentir saudades
quando me vejo num deserto
de atitudes coerentes como as tuas.

O túmulo para onde fostes, nem túmulo é,
pois não te importavas com memórias terrenas,
mas apenas com a glória de Deus.
É ambiguidade pura, pois ao te ter não te contém
ao te receber não te aprisiona,
pois quem teve o porte do teu caráter
não pode ser aprisionado pela morte.

Se meu pai estivesse aqui comigo hoje,
aqui, agora;
eu lhe diria que o amo
e o beijaria
e demonstraria com palavras e gestos
o quanto ele faz falta:

pro mundo...
pra mim...

Josué Ebenézer Nova Friburgo,

10 de Agosto de 2014 (08h39min).

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