sexta-feira, dezembro 28, 2018

FATALIDADE


O abacaxi caiu do caminhão aberto
e se espatifou no chão de paralelos
derramando lágrimas doces:
“Feliz Natal, ceia da família!”
Seus irmãos gritaram em uníssono
do caminhão que se afastava célere:
“Doce ilusão!”

Um menino tentou pegar o abacaxi semimorto
segurando pela coroa de espinhos.
Mas, o corpo do abacaxi se desprendeu
e ele ficou apenas com o espeto na mão.
Mais que lágrimas, o abacaxi
esvaziou suas artérias de vida no chão
e o menino tentou sofregamente
recolher algum doce, algum sonho...

Enfiou-se dentro de casa com as mãos juntas
portando pedaços de esperança...
A mãe aflita com o esforço do filho,
ao ouvir o som do caminhão
que se aproximava na curva do morro:
“abacaxi de Marataízes; olha o acabaxiiiii!”
correu para o portão de casa e disse:
      “Moço, eu quero três! Tem desconto?”
      “Leva três por dez real, muié!”

Entrou em casa e não disse nada.
Do primeiro abacaxi fez um suco.
Sobre o segundo, cortou em rodelas;
cobriu-as de neve de açúcar refinado.
Com o terceiro, preparou uma
“Delícia de Abacaxi”.
Entregou ao menino um prato
com três rodelas e disse:
      Não precisa chorar nem se desesperar.
Se depender da mamãe sua vida será sempre doce...

Então, devorou as três rodelas
e abraçou as pernas da mãe
com a cara lambuzada do açúcar
e do mel do abacaxi.

E foi assim que a fatalidade
de um abacaxi nos paralelos do Verão
se transformou na mais linda
declaração de amor ao rebento
que marcou aquela estação...

E o menino partiu feliz para o terraço
a levantar e a ziguezaguear com pipas no ar.
E nunca mais deixou de ser feliz!

Josué Ebenézer Nova Friburgo,
21/12/2018 (10h23min).

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