sexta-feira, maio 30, 2008

A Noite do Poeta

Poeta. Toma teu violão e vai para as esquinas do coração.
Dedilha as cordas suavemente e deixa os acordes ricochetearem na alma.
Que cortejo é este que segue cabisbaixo atrás do teu som?
Estás triste. Tua canção é triste. O som é mórbido.
Parece que os passarinhos que bicavam as sementes
que punhas no ninho, cresceram e voaram para bem longe.
O ninho ficou vazio de ovos, vazio de vozes, vazio de cantos.
Mas, poeta, a noite passa...
E o sol que irradia no centro do Universo de tua vida voltará a brilhar.
Por isso, poeta, de dentro de tua dor extraia forças.
E volta a cantar a Canção do Poeta.
A Canção da Noite do Poeta.

Rio de Janeiro, 25 de janeiro de 2005 (12h50m).

Herança

Deixarei, pelo trânsito entre vós:
algumas marcas, alguns cheiros, alguns pensamentos.
E versos soltos tentando impregnar
o ar, o ar, o ar (eco-ar)
de poesia.
Tentarei repassar uma idéia, uma fé, um sentimento.
E também uma voz tonitruante
que se fixe na memória dos que me amem. (Amém!)
E Ruben Alves e Gióia Júnior.
E todo o sentimento do mundo,
e poemas em feitio de oração...
E sob os céus do meu Brasil
cantarei no meu coração:
Jesus, a alegria dos homens!
E haverá cheiro de gente nos meus versos,
e perfume de rosas em minhas palavras,
e gosto amargo de sangue na boca calada.
E eu indo embora, deixando a trajetória
da vida para entrar na História.
É a despedida!
E a poesia,
e a poesia,
e a poesia
ficando como herança.
E você trazendo na lembrança
o fio de esperança
que a poesia o fez prenhe.

Rio de Janeiro, 24 de janeiro de 2005. (22h).

Chamavam-me...

Chamavam-me de Josué.
Josué Perequeté.
E diziam coisas...
Coisas assim:
“Josué Perequeté
tira bicho do pé
pra cumê cum café!”

E eu não gostava da brincadeira daquela gente
que fazia rima fácil com o meu nome...

Chamavam-me Zué.
E de Zué em Zué
ficavam zoando
e eu só escutando...

Mas um dia dei um tapa na cara de um garoto
que não quis parar quando pedi.
Aí tudo terminou.



Silêncio total.



Sepulcral.



Desde então me fiz ouvido, respeitado.
Mas precisei do uso da força.

Aquilo não foi bom!
E eu, incomodado, procurei o rapaz, dias depois,
pra pedir-lhe perdão.

Cantavam Josué...
E a música que cantavam -
protagonizando-me -, dizia:
“Josué era filho de Num
trabalhava por dois e comia por um!”

Eu entrava na adolescência
e apenas sorria entrelábios tímidos.

Neste tempo, se cantava na Igreja
uma musiqueta assim:
“Senhor o meu desejo é servir-te em meu viver!”
E a turminha criou uma adaptação sonora:
“Senhor o meu deJosué, amá-lo em meu viver!”

E eu simplesmente comecei
a flertar as menininhas da Igreja...

Rio de Janeiro, 24 de janeiro de 2005. (6h50m).

NOVA FRIBURGO

A cidade.
A serra que não é dela.
A subida e a descida nas fraldas dos Órgãos,
antiga Morro Queimado.
Os alemães, os suíços.
E o vagão de trem que apodreceu
no pátio da Prefeitura e apagou uma era.
Episódica era é certo,
mas que desembestou num vazio
de futuro que ainda não sabe por que não aconteceu.

Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 2005. (5h13m)

No Templo Antigo

Entre no Templo do Século XVIII
e esqueça que existe um mundo cá fora.
Na tábua dura do banco trabalhado
descanse suas preocupações.
Faça uma oração longa
e depois acorde leve num mundo de paz.

Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 2005. (15h57m).

quinta-feira, maio 22, 2008

Janelas da Alma

Os olhos são as janelas da alma
onde o Ser se debruça,
ao cair da tarde modorrenta,
no pensar - sobre o dia que está indo -,
se valeu a pena.

Os olhos são os filtros da existência
por onde, na incidência de luzes,
somos feitos cativos de uma visão:
- Se a visão é pra dentro, pode ser Ética.
- Se a visão é pra fora, pode ser Estética.

Os olhos são as molduras da Arte
que nosso Ser inquieto insiste em ver nos objetos.
E por essa moldura que temos e somos
ressaltamos o Belo, em seus contornos e cores,
ou empobrecemos a Vida.

Os olhos são as janelas da alma.
E há ali uma moça casadoira
espargindo sorrisos de neve em olhos luzentes
na expectativa de viver seu Romance.

Rio de Janeiro, 23 de janeiro de 2005. (8h38m).

PARA ATRAVESSAR UM VALE DE SOMBRAS

Quando sombras diversas esgueiram sobre sua vida
E não sabes o que fazer nem mesmo o que pensar.
E estas sombras se avolumam crescendo em você
Tornando-o impotente com vontade de desanimar.
Lembre-se que para atravessar um vale de sombras
É preciso crer na existência de um Deus que está
Em todos os lugares onde transita um coração em dor.

Quando as sombras se avolumando, você medo sentir
Inseguro diante das dores, do vazio e seus temores.
E não sabendo ao certo por onde começar; pra onde ir.
E desejando bem perto alguém que lhe faça favores.
Lembre-se que para atravessar um vale de sombras
É preciso vestir as sandálias da humildade. Estando só,
Neste vale sofrido, aguardar um Deus que de ti tem dó.

Quando as sombras cobrirem o resto de luz que havia
E a noite escura e cruel com suas trevas cobrir seu dia.
E não tendo mais forças nem esperanças interiores
Porém, desejando ajuda para espantar os dissabores.
Lembre-se que para atravessar um vale de sombras
É preciso descansar com confiança num Deus que é amor
E abandonando o desespero, aguardar humilde seu favor!

Nova Friburgo, 16/01/2005 (7h59m).

REDE BALANÇANDO

Nesta rede que embala
Meu pesado corpo de sonhar
Sinto o frescor da manhã
Que eriça meus pelos
E pelos caminhos da paixão
Flecha meu coração:
Cupido livre a beira-mar.

Rio das Ostras, 15/01/2005 (7h45m).

QUANDO TIVERES

Quando tiveres que passar um vale...
De sombra, de morte ou de dor!
Quando os vales em tua vida
Se multiplicarem, e o pavor,
Rondar o teu corpo trêmulo
E não souberes como sair...

Quando nos vales de insegurança,
De incerteza e de incredulidade estiveres,
E indagares soturno se vale
A pena esse sacrifício
De viver tomado de vício,
O vício da dor e do penar.
E sofreres a angústia da dor primacial
Desse antropos original
Que carregas dentro de ti.

Lembra-te que o vale expõe a montanha
Que está a tua frente.
E junto também te propõe a escalada da fé,
Num ousado projeto de decisão...

Queres sair do vale? Então subas a montanha!
E se não agüentares a subida
Chama, se precisar clama, que te acompanha,
Teu amigo fiel, Jesus de Nazaré!

Rio das Ostras, 15/01/2005 (6h55m).

ESCUTA

Escuta, minha amada,
O cantar do rouxinol.
Escuta, na madrugada,
Nos primeiros raios do sol.
Escuta em nova jornada
O que tenho a lhe dizer.

Escuta e amplia o som
Para repercutir a outros
Esse algo que é tão bom
E que tenho a lhe dizer.

O vento agita as folhas
Fazendo os movimentos
Dos pássaros cujo canto
Paralisados no encanto
De seu corpo seminu
Banhado nas águas da fama,
Deixaram de fazer!

Não sei em que cama
Há de repousar seu ego
Este ego inflado de si.
Mas o mundo é mal
E o tênue fio de esperança
De seu corpo ainda criança
Rompe-se como cristal...
Enquanto o violino do céu
Toca Schumann e Ravel.

Rio das Ostras, 15/01/2005 (7h25m).

BOM DIA!

O chilreio rouco da cambaxirra
Na madrugada desse lugar de sol.
É um convite louco para amar você
No canto sem perfume de sua voz,
Que me diz: - Bom Dia!

Rio das Ostras, 15/01/2005 (7h35m).

A BEIR(A)MAR

Nos arrulhos dos pombos, que se arriscam por aqui,
nas ariscas lembranças, em outras águas banhadas,
nas ondas que vêm e que vão e que indo, se não voltarem,
outras vagas virão, outros sons e o mar e o amar...
E o cheiro no ar, desse mar, desse sal, desse mal,
que me sofre e me arde por fora. Os olhos ardentes,
clementes. E me arde por dentro, essa febre que freme,
esse amor de gente num corpo pedinte. Um calor.
Uma chama de amor e o sol dessa tarde que arde
e flui por dentro e por fora esse mar que me faz amar...

E a hora não passa, embora a desgraça não tarde,
não falhe e não fale e não diga, esse amor por intriga.
Mas o sol, esse sol que é chama também a consome
e um nome lhe vem a lembrança e a bonança lhe invade.
E esse amar lhe abre um sonho, um pensar.
E o sorrir neste rosto, bem posto, no gosto do verão...
Emoção, coração e o balanço das ondas que quebram
na praia. Você transitando leveza, não foge da raia.
Desfila e se esfalfa, deslizando beleza, flanando no ar.
Nesta sede de amar e da água que banha os sonhos.
Nesta seda do meu pensamento em mares tamanhos...
Seu corpo! Há mar! Entre sonhos e fronhas e banhos de amar.

Você neste ar dos meus pensamentos suave flutua.
Meus pés nestas luas fazendo do espaço viagem.
Dos planetas distantes, minhas ruas.
E você neste sol, neste atol, neste chão da paixão
que se eleva por sobre as areias do tempo e o vento
que bate e expande meu sonhar e abate a desilusão.
Junto às areias da praia e às águas do mar, perdi meu coração.
E ali estamos nós, nossos corpos, nossas vidas,
nas areias da praia e nas águas do mar.
Nossos corpos expostos, este jeito de ser, este jeito de olhar.
Nos expomos para o mundo, num gozo profundo,
como alguém que está:
Diante de Eros em êxtase fecundo
e o cheiro no ar:
Quase amando. Quase. A beir(a)mar!

Rio das Ostras, 15/01/2005 (7h58m).

terça-feira, maio 06, 2008

SAUDADES

Ainda hoje a Saudade me invade.
Ainda hoje sinto esta presença que anuncia uma ausência.

A vida vai entrando na rotina
E quando a gente menos atina,
Eis que a Saudade chega sem pedir licença.
Ela vem:
Como ensaio de Escola de Samba em pré-carnaval;
Como batuque de Parada de Sete de Setembro;
Como carro de som apregoando os abacaxis de Marataízes.

São sons e presenças invasivas, tal como
Esta Saudade que chega intrometida.

Tenho saudades de minha irmã.
Tenho saudades de meu pai.

E o que me traz de volta esta Saudade foi a lembrança.
Daquela pipa-estrela enorme que ele fez pra gente.
A única!
E que nós levantamos nos altos céus de Friburgo
E o vento levou para bem longe
Num rolo grosso de barbante idem.

A vida tem dessas coisas:
Aquilo que esquecemos por causa do cotidiano
A Saudade traz de volta,
Numa charrete puxada por dois cavalos:
Um Ébano, como a noite,
E dois olhos brilhantes de mistério-estrela...
Outro Marfim, como a paz de uma
Bandeira frágil
Tremulando neste campo de batalha da existência.

E a charrete que traz a Saudade
Avisa que terá que voltar logo -
E retornar ao passado -
Onde fará sobre-existir o Sonho.

A Saudade me trouxe dentro da charrete, a pipa.
E trouxe o barbante e a folha de seda colorida.
E trouxe o vento e a hora da tarde em que o vento
Funcionou e empinou a pipa no ar.
E trouxe aquela tarde e o vento da tarde no rosto
E também o friozinho que sentia
Recompensado pelo coração que se abria
Em sorrisos com papai ao meu lado, soltando pipa.

A Saudade trouxe junto papai de volta...
Papai grandalhão / papai meninão.
Papai levantando pipa com sua própria mão.
E dando linha pra pipa ir longe;
E dando corda para os nossos sonhos ganharem os céus.
E os nossos sonhos de meninos da Serra
Subiram mais altos que as montanhas e
Descobriram o outro lado da pedra...

Quem disse que Saudade não é bom?
Saudade traz de volta quem a gente ama!
E a Saudade é irmã da Realidade,
Pois ela nos ajuda a não esquecer aqueles
Que um dia deixaram marcas impressas -
Com logótipos de Amor - em nossas vidas.

Rio das Ostras, 14/01/2005 (21h08m).

RESPOSTA A MANUEL BANDEIRA

Teu soneto inglês, o de número dois,
o senhor bem que poderia ter deixado pra depois.
Para o amanhã. Talvez para o infinito.
Talvez, o nunca. E não haveria tal grito!

Este grito de ódio, fruto de uma inadequação...
Quem te culpará por não teres sido fecundado de fé?
E na ausência da fé, sem comunhão, não teres a quem chamar de irmão?
E teres que andar na vida atribulado, sem algo atrelado, que te pusesse de pé?

E quem foi que te disse que certo tremor e certa insegurança,
e a crença e a fé, e a inocência de um coração de criança,
tudo isto não é humano, não pode ser plano pra levar-nos à maturidade?

Ah, Bandeira! Não há como morrer sem lágrimas,
pois a vida não se pode perder como se fora dracmas.
Da dor se faz a força e na vida faz-se o ensaio para a eternidade!

Rio das Ostras, 14/01/2005 (20h11m).

A KATIA CARDOSO SOARES

Não posso crer que há pessoas que só pensem
O amor infinito apenas como um prazer.
Eros castigando corpos que se imprensem
Na volúpia do sexo, a busca do gozo ter.

Ver a mulher apenas como corpo:
Seios, face, bunda ou algo mais...
O espírito, neste ser, dado como morto.
Sem lembranças! O que fica o tempo desfaz!

Fui, certo tempo, peregrino de um amor,
Até ancorar-me calmo neste mar.
Fiz de ti meu porto e por onde for
Minha nau singrando há de te amar.

Se bate forte uma saudade ou um desejo
É sonho achar que volto a ti tão brevemente.
E da angústia faço logo um despejo
Para entrares, neste mar, suavemente.

Não posso crer que há pessoas que só pensem
O amor infinito apenas como um prazer.
Sei que tu existes; meus olhos não mentem.
Sou grato a Deus, porque nos céus, vou te rever.

Macaé, 14/01/2005 (12h30m).

SALMO 23

O Senhor é o meu pastor; nada me faltará.
Deitar-me faz em verdejantes e lindos pastos
e guia-me manso a águas tranqüilas e faustos
onde o refrigério d’alma, em Deus, me alegrará.

Guia-me nas veredas da justiça por amor
do nome que é sobre todo nome na terra.
Inda que ande em vale de sombra ou guerra
não temerei mal algum. Estás comigo Senhor!

Tua vara e cajado me consolam à mesa,
que diante dos inimigos preparada está.
O óleo na cabeça e o cálice a transbordar

mostram, certos, que misericórdia e gentileza
me seguirão em todos os dias da minha vida,
até habitar na Casa do Senhor ao fim da lida.

Nova Friburgo, 13/01/2005 (7h01m).

CONFLITO DE GERAÇÕES*

Você enfrenta hoje o que passei ontem;
você sente hoje o que ontem senti.
Você chora as lágrimas que já derramei
e curte emoções que eu já vivi.

O tempo não pára e a idade é remédio
que cura este mal e absorve este tédio.
No vento o tempo escorre na fronte
da vida o relógio que marca na fonte
da água que corre e vai para o além;
e vai para a frente e nos deixa pra trás.
O tempo desfaz o choro sem rumo,
a lágrima sem colo, a vida sem prumo...

Você enfrenta hoje o que passei ontem;
você sente hoje o que ontem senti.
Você verte as lágrimas que eu já vi
Nos olhos cansados de muito homem.

Os ponteiros da vida se ajustam velozes.
Marcam despedidas no ouvir de umas vozes.
E o tempo que anda, coração que balança,
que sacode a poeira juntada na estrada.
Enquanto você impassível assiste
a vida voando no conforto da sacada
da casa de pedras que o tempo deixou.
E seu coração que é de carne e de amor
derrete-se ao som da bandinha da praça,
do coreto que o limo e a lama da raça
deixou para o ontem da vida lembrar,
e o hoje na derme, paixão pra sentir,
enquanto aguarda - se o amanhã existir -
na memória da vida uma história guardar.

Você enfrenta hoje o que passei ontem;
você sente hoje o que ontem senti.
Com o lenço na mão seca lágrimas ao vento.
A areia escorre na ampulheta do tempo.

Enquanto isso:
Aguardamos os filhos de nossos filhos!

Nova Friburgo, 09/01/2005 (15h08m).

*Este poema foi vencedor do Concurso da Editora Litteris.