domingo, junho 01, 2008

À PROCURA DA POESIA

A Israel Belo de Azevedo

Imaginei compor um lindo poema
que a cada geração fosse descoberto
poesia a fluir em cada fonema
e a Lira sempre ficando por perto.
Mas surge, de início, dúvida cruel
toma conta do meu ser ali pensante:
Seria de grandes formas, até o céu?
Ou sonetto, canção curta, de instante?

Se eu escolhesse uma poética teatral
o heroísmo levando a uma epopéia
não sei se a conduziria até o final...
Seria sombra da Eneida e Odisséia!
Posso escolher também fazer um romance
na origem mítica da poesia.
Mas com que palavras darei a nuance
de idílio, égloga ou rebeldia?

Talvez fizesse um discurso poético
semelhante ao Zaratustra de Nietzche.
Mas meu projeto far-se-ia patético
ao transformar-se em um mero pastiche.
Voei, então, até a hinódia cristã,
buscando ali uma linguagem hínica.
Uma prece, salmo, longe da res pagã
que mostre do coração sua mímica.

Mas a Lira cobrava-me algo mais forte;
toda a musicalidade de um Rimbaud.
Deixei fluir sentimentos até de morte,
pra não divagar como se fora um robô.
Compus canções, baladas, também um lai,
refletindo a vida e os seus mistérios.
Liberei a alma de tudo que a trai,
buscando poesia em sonhos etéreos.

Mas ainda assim não achei o que queria.
Revirei mundo; fui ao baú da vovó!
Não é qualquer verso que se faz poesia:
Virelai, vilancete, pantume e rondó.
Então, aprofundei-me no barroquismo,
me fiz burlesco, busquei preciosidade.
Não preciso, nesta altura, de eufemismo:
Foi no grotesco que vi diversidade!

Descobri da poesia o lúdico:
os palíndromos e tantas holorimas.
Fiz-me artista, tornei-me até um músico
de acrósticos, anagramas, outras rimas.
Quando triste, compunha bela elegia
refletindo uma alma tão queixosa.
Descrevendo esta grave melancolia
que singrava como nau lamuriosa.

Mas no dia em que queria me vingar
usava a sátira como meu espeto.
Com a máscara do ridículo debruar
toda a arte do jocoso e do panfleto.
Porém, quando silente e um tanto só,
sentindo a tarde que em mim singela cai,
buscava provérbios sem pejo nem dó
na linguagem gnômica, pura, do haikai.

Tudo à procura da Musa em vida,
a Poesia que me fizesse feliz.
Da tristeza, presto, fazer despedida.
Viver a vida assim, como sempre quis.
A questão era: Como afastar o mal?
Longo o pensar? Não pode ser odelette!
Do Renascimento trouxe o madrigal,
o bobo da corte e um canivete.

Cansado da paródia e do sofisma
vi que a poesia não é unívoca.
E antes que tivesse um aneurisma
abandonei minha vida equívoca.
Poesia faz rir, é faceciosa
e pode trazer em si filosofia.
Se é sátira pode ser contenciosa,
e assim servir até de galhofaria.

Desse jeito fui descobrir o sublime,
o gênero nobre por excelência.
O lirismo que o coração exprime;
amor mostrando sua plenipotência.
A ode e sua origem musical
evocando a metafísica visão.
Sopro de Musa et coetera e tal
que tanto bem faz ao pobre coração.

Então desandei a cantar as minhas odes,
imaginando as de Píndaro e mais.
Fiz-me arauto de tão lindos acordes
outorga da vida, do amor e muita paz.
Fiz-me Lautréamont e mesmo um Claudel
em odes belas e estrofes simétricas.
Subi paredes do pensamento no papel,
dos latinos esconjurei as tétricas.

Mas os gregos antigos me perseguiam
Com seu estilo, erudição, entusiasmo.
E as liberdades da Musa me seguiam:
Da Musa, as liberdades e seu quiasmo.
Foi na ode que encontrei meu acalanto,
como Saint-John Perse construí poemas
Então, nela estanquei todo o meu pranto,
tornando-me autor de lindos grafemas.

Nova Friburgo,
(iniciei as 7h05m de 30/01/05
e terminei as 6h54m de 31/01/05).

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