Estou no
décimo andar
de um
arranha-céus fracassado,
que nasceu
centro-comercial
e virou
residência de rostos feios,
paredes
esburacadas,
rebocos
caindo,
pernas
cansadas,
fios soltos,
homens
loucos,
num
emaranhado
destrambelhado
de decadência
ritual...
Gente
soturna
caminha
desesperanças
pelos
corredores escuros
sem
ventilação adequada.
A
desconfiança reina
nos olhares.
Sinto-me um
deslocado
e resolvo
entrar.
O
apartamento é amplo,
construção
antiga,
pé direito
alto,
espaços bem articulados
com
resquícios de art déco
no que ainda
resta de estilo.
O cheiro é
nauseabundo.
Transito de
janela a janela
em busca de
ar.
Há quanto
tempo este
mofo não é
aliviado?
Há um
resíduo de dignidade
nos velhos
móveis
dispostos
pelos cômodos;
ali abandonados
desde que a
avó do
meu amigo
morrera.
Abro a
janela da frente
e uma
golfada de ar quente
invade o
ambiente.
Olho pra
rua...
o movimento
dos carros,
os prédios
frontais,
edifícios
que marcam época
e que
sinalizam
o
deslocamento do centro
da cidade
para outro eixo.
Suspense,
apreensão,
vazio.
A morte da
velha,
as lágrimas
do amigo,
os quadros
nas paredes,
gavetas
abertas,
o reencontro
com o passado,
as cartas,
as
fotografias,
a memorabilia
que propõe
um clima de
saudade.
O que é
dentro, é fora:
gente
sombria e triste
apossou-se
do lugar.
Não se
investe,
não se
ajeita,
simplesmente
se arrasta
para o fim
do mundo.
As pessoas
morrem
junto com o
seu lugar
numa
simbiose
entre seres
e coisas
em que as
pessoas
vão ficando
cinzentas
como as paredes
desnutridas.
Abro uma das
janelas dos fundos.
Há um amplo
respiradouro
num espaço
interno
para onde
convergem
quatro
blocos de prédios
e de onde se
vê
a laje das
sobrelojas.
Me atraem o
olhar:
um violão
quebrado,
um cão
morto,
um gato
vivo,
inúmeras
sacolas plásticas
que
denunciam restos, lixos.
Espere!
Há algo se
movendo
por entre um
monturo
de entulhos
de obras.
Crianças
pequenas e barrigudas
brincam seus
vermes
por entre os
resíduos de esperança.
Para onde
caminha a humanidade?
Meu coração pergunta
em meio a
decadência visual.
A poluição é
sonora, olfativa
e, também,
visual.
Um jovem
casal faz sexo de pé
(com a
janela aberta)
um andar
inferior oposto
de onde
estou
(se é que
por lá exista janela).
Cerro as
bandas
da janela de
onde estou.
Volto-me
para a sala
e meu amigo,
sentado
na velha
poltrona,
acaba de
contar
os cem mil
dólares
que
encontrou na
velha pasta
de couro
que foi de
sua vó cabeluda.
Josué
Ebenézer – Nova
Friburgo,
18/01/2017 (05h43min).
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