terça-feira, janeiro 01, 2008

EU SÓ PEÇO A DEUS

A João José Soares Filho

1

Eu só peço a Deus
que livre meu pai da dor e do sofrer!

Saí do hospital ainda há pouco
e trago comigo as marcas
de uma noite mal passada
e de um corpo que caminha esperanças
pelas ruas de Friburgo;
sem atrativos para ser saboreado por ninguém!

São dias inseguros esses...
E quem me veja neste estado -
Inexpressivo estado de olhar que se perde no horizonte! -
Rosto amarrotado;
caminhar cambaleante;
haveria de me preferir escondido atrás de um monte
- sejam essas milenares
formações rochosas de minha terra;
- sejam monturos fabricados pelo homem.
Monturos de qualquer coisa
que me escondam de mim mesmo.

Mas, talvez, uma boa alma,
um alguém que me encontre assim desprevenido,
me queira diferente
e me conduza para junto de uma fonte:
Desconcertante
e inesgotável Fonte
que num instante
me tire detrás do monte.

- E jorre sobre mim as águas da esperança!

Porém, nestes inseguros dias:
Em que noites se passam em claro
e dias se fazem trevas.

- Não sei!

Não sei se Deus tem uma jorrança,
qualquer rescaldo de esperança,
por isso clamo por gotas.
- As gotas de sua presença!

Se puder sentir Deus se aproximar
E respingar sobre mim:


As
Gotas,
suaves gotas,
molhadas gotas,
refrescantes gotas.
As cristalinas gotas
que caindo sobre as
desesperanças de
meu ser, atuem
fortemente
para a
paz!


Acalmar-me-ei!

Preciso das gotas
de um líquido puro
de um líquido vital
que me restaurem o sentido da vida
e me tragam de novo o brilho da existência!

Nestes dias tão inseguros,
ao ver meu pai assim:
Tão só,
tão impotente
naquele leito que queria fosse meu...

Eu só peço a Deus
um pouco de misericórdia!


2

Eu só peço a Deus
que dê condições a meu pai de suportar o que lhe cabe.

Já estou cá na lida,
nos embates da vida
e sua caminhada pra frente,
para o amanhã,
pois a vida não pertence a si mesma
nem anda para trás!

Mas eu peço a Deus,
sim, eu só peço a Deus:
Se não for possível tirar-lhe a dor;
aliviar-lhe o sofrimento;
Se não for possível livrá-lo do mal;
fazê-lo suportar o tormento.

E fico eu matutando comigo,
tentando imaginar que cota de sacrifício
ainda se exigirá dele
já nesta idade
quando o vigor da mocidade
de há muito passa longe de seus músculos!
Fragilizados músculos
que se largam dançantes
sustentados pelas peles,
acobertando ossos que doem,
que se esboroam, esfarelando-se
na cruel doença
que
consome
a vida
e a força
da vida
e
muitas
vezes
a crença!


Mas, Senhor!
Nestes dias tão tenebrosos:
De ver meu pai assim
tão assim,
indescritivelmente assim!

Tão largado,
no leito da dor,
da cruel espera,
de uma quimera
que, quem dera!,
pudesse aparecer
pondo um fim ao seu sofrer.

A gente ali presente:
Mamãe tão doentinha,
alquebrada,
mas cumprindo a sua missão de adjutora.
Meus irmãos, todos nós, cumprindo a nossa parte
de se fazer presente,
de assisti-lo.
Mas, mesmo assim:
A dor é dele, meus queridos!
É ele que sente, entende?
É nele que dói, que rói e corrói
este câncer maldito que se instalou sem avisar!
Não sei quem inventou esta ambivalência: maligno / benigno!
- Coisa ruim é sempre má!

Se ele tem que atravessar esse deserto
faça de nossa presença junto ao leito do hospital
um oásis reparador e refrescante,
um oásis restaurador e repousante,
em meio ao seu sofrer!

Eu só peço a Deus
um pouco de alívio para papai!

3

Eu só peço a Deus
que preserve a fé de meu pai por todos os seus dias!
A gente vai para o hospital levar conforto e carinho
Mas a gente sai do hospital abastecido de conforto e carinho.

A gente sabe que ele está sofrendo...
Mas não há murmúrios,
sequer desesperos.
Não há gritos, somente interjeições,
quando a dor é tamanha,
quase impossível de suportar!

- “Ah! Aaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhh!”

E quando presenciamos este desabafo da dor,
uma pontada forte espeta nossa alma.
Se fosse possível
sofreríamos por ele;
Se fosse possível
deitaríamos naquele leito no lugar dele;
Se fosse possível
até a doença assumiríamos em seu lugar.

- “Ai, meu Pai!”

Ele exclama sentido!

Papai deve estar sofrendo muito.
Que dor lancinante rasga-lhe o corpo
E oblitera a alma?

Meu Deus!
Como é finito o ser humano.
Como somos limitados por nossa própria condição.
Não fora a mensagem do Evangelho,
não fora o resgate do Cristo,
A cruz.
O túmulo.
A ressurreição.

Onde a vitória sobre a maior de todas as nossas inimigas?

É no teu Cristo, ó Deus, que repousa a nossa esperança.
Por isso, oh Pai amado!
No leito de meu pai repousa a tua paz!
Nas dores que ele sente,
sê o bálsamo aliviador!
Nos momentos de vazio,
escuridão e
sofrimento.
Sê tu presente e preenche a vida dele.
Acerca-o de luz e ilumina com dulçor.
Conforta-o com o Espírito,
produza nele alento.

Não permitas que o desespero
de uma dor não assimilada;
Ou as batidas insanas da alma,
cada uma martelada,

Firam seu coração,
maculem sua fé,
aniquilem a esperança,
_ Oh, Jesus de Nazaré!

Eu só peço nesse momento,
quando a fé está ao relento,
e o frio é cortante:

Fortaleça o seu coração,
este coração de gente!
Preencha-o da emoção
de na terra ser um crente!

Para que mesmo na dor,
num leito de hospital,
meu pai de história bonita,
estrada de minha vida,
suporte a todo o mal,
e viva por seu amor!

Eu só peço a Deus
um pouco de ternura e a preservação da fé!

Nova Friburgo, 07/12/2004(13h28m).

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