quinta-feira, março 15, 2018

NO CULTO

Não ouço mais o suave louvor de teus lábios,
amigo, nem vejo a determinação dos teus braços
a se erguerem firmes na emoção da adoração.

Só vejo os lábios cerrados
e o rosto apagado sem expressão.

Percebo apenas as cinzas,
silêncio e cinzas,
monturos inexpressivos onde já houve fogo.

(Tua presença é destoante em meio ao crepito do Altar
espectro insignificante na fotocélula divina
em que os movimentos das almas que o rodeiam
denunciam sua passividade mórbida...)

Meu triste irmão, sei que estás
derrotado como um campo de várzea,
onde não há bola rolando,
nem há alegria de petizada eufórica:
esta algazarra recreativa da família.

Enquanto todos transitam na adoração
teu corpo inerte, expõe a paralisia da alma.

De que te servem: qualquer gesto meu,
a percepção do que sofres, e até
o encontro de olhares no culto;
se te desvias para o nada,
para o disfarce inútil do caos?

E o que dizer de um abraço,
de uma oração breve ou longa
de uma palavra boa, canção que entoa,
meus lábios para ti?
Se esta tua vida oblonga
pobre irmão – está a diminuir?

És pura inadequação no culto
teu estado é o primeiro; o do pecado.
Sintas ao menos que te amo
e que todo o meu ser é contrição...

Não vejo a Estrela da Manhã em teus olhos,
nem lágrimas furtivas de arrependimento;
mas a secura e frieza do mármore,
lápide mortuária do vazio sem Deus,
em que a luz do Sol foi embora
e escrito está em letras garrafais:
AQUELE QUE MORREU ANTES DA HORA!

Josué Ebenézer Nova Friburgo,
08/03/2018 (05h44min).

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