terça-feira, maio 28, 2019

MÚLTIPLOS OLHARES



Era preciso que o mundo visse
os olhares dessas crianças. Não pelos
olhares do mundo,
mas pelos olhares profundos
por trás de um pé de chinelo.

Em que mundo habitamos
para não enxergar a beleza
por trás de pés-de-chinelo
que pouco dizem ou nada
aos que não conseguem
enxergá-los?

O mundo que não vê
é o mundo que finge não saber
a composição dos mundos
que habitam corações simples
que não se executam nos salões
ou nos teatros da vida
mas nas estradas das vilas
e do mundo seus grotões.

Não sei de onde vem esta foto,
mas presumo que da Índia
pelos indícios que me tocam
a sensibilidade cultural.
Preciso despertar-me
pra verdade que a vida
habita lugares que nem sei...

E por certo a vida plena
não está nos artificialismos
das urbes apinhadas
de cruéis mecanismos
que tornam mal amadas,
mal vividas, desprezadas
não só crianças, adultos,
que sofrem grandes sismos.

Era preciso que o sorriso
não cessasse nesse mundo,
mesmo sem dentes à mostra.
O sorriso do rosto puro
é a maior evidência de alegria
na singeleza da criança
na diversão pura e simples
do instantâneo da felicidade
que o dinheiro não compra
e o estrangeiro (estranho) não dá.

Não pelos olhares do mundo
que não tem olhos para o outro
e não se enxerga no próximo
que é um igual, seu irmão.
Mas pelos olhares de quem
abstraindo-se do umbigo
se aventurasse comigo
a ver com o próprio coração.

Na pintura desse quadro
tela viva na retina
que tira a vida da rotina,
do vazio e desrazão.
Abandono o contrassenso,
pois a natureza me grita
na mudez da imagem ao vento
para também dar as mãos.

No instantâneo da vida
de cinco crianças morenas
não há palavras fáceis
ao juntar seus grafemas.
Onde, a liberdade? Onde, a paz?
Que é feito da solidariedade?
Se não as enxergo, onde jaz
o tema mundial da igualdade?

Será que são indecifráveis
os olhares das crianças?
Até sem simples bolas infláveis
chamam a alegria pra danças.
O coração quando alegre
faz formoso qualquer rosto.
Não há quem não se entregue
ao momento de fazer gosto.

A pele jovem das crianças
emite uma luz tão fulgente
que somos atraídos de cara
por este jeito de ser gente.
Tem simplicidade latente
e tem cheiro de terra pisada
e tem peraltice infante
no rosto da garotada.

O líder da selfie inusitada
é o maiorzinho de todos.
Que prestos se comportam
na selfie daquela estrada.
Ele está garboso e cônscio
e enquadra os outros quatro
num chinelo que só néscio
não enxerga as silhuetas.

O rei está nu e as redes
sociais se desnudaram.
Ante a selfie que quebrou
a internet que abandonaram.
Se as crianças se enxergam
num chinelo de pé só
por que o mundo não vê
os coitados que dão dó?

Mas não falo só dos pobres
e oprimidos do meu Brasil
falo das crianças simples
desse mundo tão hostil.
Que merecem a atenção
dos governantes e pais;
dos que têm no coração
esperança e muito mais.

Falo dos adultos infames
que só pensam em si mesmos
que promovem seus derrames
de flores murchas nos campos.
Falo da pele que incendeia
a alegria desse momento;
estes meninos da selfie
merecem um monumento.

É tênue a luz do instante
que registra essa pureza.
Tem um que ri bem solto,
menina protetora em pose,
tem quem quer entender
o que se passa ao lado
tem quem disfarça sorriso
mas acaba por se envolver.

São múltiplos os olhares
que se podem dar ao mundo.
Os que vêm dos que veem
e os, dos que são olhados.
E é preciso amar a todos.
Nenhum sol clareia mais
que o de rostos felizes
de crianças em sua paz!

Josué Ebenézer Nova Friburgo,
24/05/2019 (15h05min).

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